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Delícias são tudo o que nos faz felizes: um livro, a magia dum poema ou duma música, as cores duma paleta ... No jardim o sol não raia sempre mas pulsa a vida, premente.
É então isto um livro,
Manuel António Pina O segundo gato
(Paul Klee)
Manuel António Pina Esplanada
(Paulo Ossião)
Naquele tempo falavas muito de perfeição,
da prosa dos versos irregulares
onde cantam os sentimentos irregulares.
Envelhecemos todos, tu, eu e a discussão,
agora lês saramagos & coisas assim
e eu já não fico a ouvir-te como antigamente
olhando as tuas pernas que subiam lentamente
até um sítio escuro dentro de mim.
O café agora é um banco, tu professora do liceu;
Bob Dylan encheu-se de dinheiro, o Che morreu.
Agora as tuas pernas são coisas úteis, andantes,
e não caminhos por andar como dantes.
(in Todas As Palavras, Assírio & Alvim)
Manuel António Pina A equação de Drake
(numa exposição de Ilda David)
(Ilda David)
Entre duas águas
(entre H e HO)
corre uma água só
transportando a equação do mundo
até ao mais fundo
sítio do coração,
onde se torna vida o mundo
e a água respiração.
Vinda do mundo,
corre para dentro a vida da pintura,
entre tempo e tempo,
líquida e pura.
Volta-se uma última vez para trás,
e a única coisa que dela vês
é o seu olhar olhando-
-te e desprendendo-se de ti.
9/5/99
(in Manuel António Pina, Nenhuma Palavra e Nenhuma Lembrança, Assírio & Alvim)
Manuel António Pina Os livros
(Adão Cruz)
É então isto um livro,
este, como dizer?, murmúrio,
este rosto virado para dentro de
alguma coisa escura que ainda não existe
que, se uma mão subitamente
inocente a toca,
se abre desamparadamente
como uma boca
falando com a nossa voz?
É isto um livro,
esta espécie de coração (o nosso coração)
dizendo 'eu' entre nós e nós?
(in Manuel António Pina, Todas as Palavras, Assírio & Alvim)
(Adão Cruz)
Como quem, vindo de países distantes fora de
si, chega finalmente aonde sempre esteve
e encontra tudo no seu lugar,
o passado no passado, o presente no presente,
assim chega o viajante à tardia idade
em que se confundem ele e o caminho.
Entra então pela primeira vez na sua casa
e deita-se pela primeira vez na sua cama.
Para trás ficaram portos, ilhas, lembranças,
cidades, estações do ano.
E come agora por fim um pão primeiro
sem o sabor de palavras estrangeiras na boca.
Escreveu assim o Manuel António Pina em 1 de Agosto de 2012 no JN
(para a Carla Romualdo)
(Brassai)
O leitor que, à semelhança do de O'Neill, me pede a crónica que já traz engatilhada perdoar-me-á que, por uma vez, me deite no divã: estou farto de política! Eu sei que tudo é política, que, como diz Szymborska, "mesmo caminhando contra o vento/ dás passos políticos/ sobre solo político". Mas estou farto de Passos Coelho, de Seguro, de Portas, de todos eles, da 'troika', do défice, da crise, de editoriais, de analistas!
Por isso, decidi hoje falar de algo realmente importante: nasceram três melros na trepadeira do muro do meu quintal. Já suspeitávamos que alguma coisa estivesse para acontecer pois os gatos ficavam horas na marquise olhando lá para fora, atentos à inusitada actividade junto do muro e fugindo em correria para o interior da casa sempre que o melro macho, sentindo as crias ameaçadas, descia sobre eles em voo picado.
Agora os nossos novos vizinhos já voam. Fico a vê-los ir e vir, procurando laboriosamente comida, os olhos negros e brilhantes pesquisando o vasto mundo do quintal ou, se calha de sentirem que os observamos, fitando-nos com curiosidade, a cabeça ligeiramente de lado, como se se perguntassem: "E estes, quem serão?"
Em breve nos abandonarão e procurarão outro território para a sua jovem e vibrante existência. E eu tenho uma certeza: não, nem tudo é política; a política é só uma ínfima parte, a menos sólida e menos veemente, daquilo a que chamamos impropriamente vida.
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Porto é melhor que Benfica, isto é uma prova clara
Magnífica verdade,"[...] que viver dos outros impl...
Obrigada! Texto maravilhoso a ler e reler! Desde p...
Muito interessante este texto do Raul Brandão. Que...
Desculpe, mas isto é demasiado grande para ser o c...