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Jardim das Delícias


Sexta-feira, 20.02.15

Alteração das receitas nas farmácias pesa mais nos bolsos dos doentes portugueses

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Prescrição por DCI

Alteração das receitas nas farmácias pesa mais nos bolsos dos doentes portugueses

 

Tal como a Ordem dos Médicos prevenira, há mais de dois anos, a prescrição de medicamentos por Denominação Comum Internacional (DCI) deixa os doentes completamente desprotegidos nas farmácias, com graves riscos e prejuízos clínicos e financeiros.

Senão vejamos. De acordo com uma notícia publicada esta semana pelo Jornal de Notícias (notícia intitulada «Utentes pagam três milhões a mais por mês na farmácia», publicada na edição de 16 de Fevereiro de 2015), os utentes da região Norte de Portugal "estão a optar ou a serem induzidos a optar por medicamentos mais caros na farmácia".

A monitorização feita pela Administração Regional de Saúde do Norte revelou que "40% das embalagens vendidas com prescrição por DCI tinham preços superiores aos do quinto medicamento mais barato". O que se traduziu numa perda de poupança próxima dos três milhões de euros.

Tal como o Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos alertara, ao definir a prescrição por DCI sempre que um medicamento tenha um equivalente no mercado de genéricos, os interesses dos doentes não são devidamente protegidos já que, no limite e alegando a falta de medicamentos genéricos mais baratos, a farmácia pode "prescrever" um fármaco mais caro do que aquele que o médico indicou.

Desde início que o CRNOM e a Ordem dos Médicos alertaram o Ministério da Saúde, que pela falta de acção é cúmplice da actual situação, que a prescrição por DCI não só não aumentou a taxa de penetração dos genéricos em Portugal, além da curva ascendente que já se verificava, como tem provocado todo o tipo de iniquidades na hora dos doentes levantarem o seu receituário. Desde logo porque as receitas de prescrição electrónica indicam não o preço mais baixo possível para um princípio activo mas “o preço máximo possível” em cada caso, enviesando a mensagem e confundido propositadamente o doente na hora da escolha.

Depois porque apesar da lei exigir que as farmácias dispensem um dos cinco medicamentos mais baratos existentes no mercado, a verdade é que a esmagadora maioria dos doentes não tem conhecimentos técnicos que lhes permita fazer esta escolha informada. Em última análise, será sempre o farmacêutico a fazer a opção pelo medicamento a comprar.

Não obstante todos os alertas feitos pela Ordem dos Médicos, o Ministério da Saúde não tomou uma única medida no sentido de proteger adequadamente os reais interesses dos doentes.

Numa altura em que a monitorização do mercado farmacêutico vem, infelizmente, provar a pertinência dos alertas feitos pela Ordem dos Médicos, por uma questão de transparência e qualidade é fundamental que:

  • O Governo proteja os doentes e a boa medicina e proceda à alteração da legislação da prescrição por DCI, para que se actue com base num princípio de rigor técnico e científico que defenda a Saúde dos doentes e a qualidade do seu tratamento
  • Todos os médicos prescrevam os genéricos com marca, justifiquem a não substituição da marca e que expliquem aos doentes que o objectivo é protegê-los das trocas comerciais ao balcão da farmácia, garantindo o tratamento mais adequado;
  • Todos os médicos, na terapêutica de curta duração, que não pode ser justificada pelos 28 dias, escrevam manualmente na guia de tratamento a marca do genérico que pretendem e expliquem essa decisão ao doente, para não permitir que a farmácia troque essa marca e o doente seja prejudicado.
  • As empresas responsáveis efectuem uma correcção dos programas informáticos de prescrição e reduzam as deliberadas dificuldades informáticas colocadas aos médicos para seleccionar uma marca de genérico (ainda que seja a mais barata!) durante a prescrição;

No limite das suas competências, o Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos continuará atento a esta matéria e tomará todas as medidas que entenda como necessárias e pertinentes para continuar a defender e proteger os interesses e direitos dos doentes.

 

O Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos

Porto, 19 de Fevereiro de 2015

 

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por Augusta Clara às 13:53

Quarta-feira, 08.05.13

O Colesterol - Adão Cruz

 

Adão Cruz  O Colesterol

 

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   A propósito da entrevista a Uffe Ranskov, investigador dinamarquês e fundador da Liga  Internacional dos Céticos do ColesterolAdão Cruz, médico cardiologista, enviou-nos o seguinte texto:

 

 

   Há muitos anos que eu procuro o melhor discernimento sobre esta e outras matérias. Não é fácil, porque somos bombardeados com centenas de estudos, a meu ver nem sempre credíveis, apesar de serem impostos como as tábuas de Moisés. Além disso, toda a investigação e exploração que sustenta os interesses económicos é mais ou menos perversa, em alguns casos escandalosa e desumanamente perversa, a despeito de se apresentar com a mais humanista e humanitária das caras. Todos conhecemos casos destes, especialmente nos dias de hoje. Não duvido da existência desta perversão em qualquer campo, neste caso da própria medicina e dos interesses consumistas que ela gera. Há mais de trinta anos que falo e escrevo sobre a iatrogenia médica, seja ela medicamentosa, social ou económica. Sempre considerei os remédios muito perigosos, ainda que muitos deles sejam muito benéficos e quase milagrosos. Mas o exagero do consumo, imposto pelos interesses dos produtores, pela incompetência e pela ausência de bom-senso, pode ser francamente nocivo. Os efeitos laterais e secundários dos medicamentos são muito complexos, por vezes difíceis de diagnosticar,  e por vezes muito perigosos e até mortais, sobretudo nos dias de hoje em que a polimedicação e as comorbilidades são “mato”. O caso do colesterol é francamente controverso. Sou daqueles que sempre desconfiaram das certezas que nos impõem, sobretudo tratando-se de uma infindável mina de ouro. A não acautelada moda do colesterol, não acautelada por quem, como nós, tem uma grande responsabilidade, expandindo-se acriticamente como a moda da mini-saia, é de uma grande incompetência e perversão. Um grande debate sobre a verdade e a mentira destas coisas deveria ser uma exigência universal. Quanto a mim, sempre prescrevi e prescrevo, cuidadosamente, as Estatinas, na prevenção secundária, e na prevenção primária quando existe um importante contexto de risco. Fora disso, de uma maneira geral, a não ser em casos especiais, não uso, mesmo com valores “elevados”. Entre alguns dos meus colegas, não todos, mais papistas do que o papa e de alguma maneira fundamentalistas, isto pode ser considerado errado. Tenho de ter sempre muito cuidado deontológico no aconselhamento e na explicação aos meus doentes. Mas tenho uma experiência de quarenta anos, com milhares de doentes que me passaram pelas mãos, e julgo, com a consciência que me é possível, que, com esta forma de agir só os tenho beneficiado. No passado, os valores ditos normais do colesterol eram bastante mais elevados do que hoje, e não acredito que a natureza estivesse errada. Eu próprio sempre tive valores “elevados” de colesterol.

 

Adão Cruz

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por Augusta Clara às 13:00

Sexta-feira, 11.01.13

Já não basta aos idosos serem velhos - Adão Cruz

 

Adão Cruz  Já não basta aos idosos serem velhos   

 

 

  Em artigo anterior fiz a defesa do Serviço Nacional de Saúde, frente à Exploração Capitalista da Saúde. Esta reflexão, contudo, não é tanto em relação ao SNS que existe, mas ao que o SNS poderia vir a ser, se houvesse vontade política. Ao que o SNS poderia vir a ser se houvesse uma vontade séria de eliminar os seus defeitos, as suas imperfeições e as suas carências, no sentido de o programar para um profundo desenvolvimento, indispensável à saúde de um povo.

Hoje, o conhecimento e a experiência médica são muito grandes. A investigação científica atingiu uma dimensão incalculável e a sua aplicação prática trouxe avanços inimagináveis na assistência aos doentes. Existem muitíssimos profissionais idóneos, com excelente formação técnica e humana e com grande vontade de colaborar nesse promissor futuro que seria um SNS de alto nível. Assim como existem instituições vocacionadas para a defesa dos profissionais, dos doentes e do correcto exercício da medicina, com uma consciência mais viva da nobreza da sua missão. Tudo indica, infelizmente, que este valioso património profissional, científico, social e humano será desprezado e destruído pelos poderes governativos vigentes.

Mas não podemos escamotear os defeitos, grandes imperfeições e carências no SNS e em toda a assistência médica em Portugal. As pessoas pensam que há coisas que só dizem respeito aos profissionais de saúde, especialmente aos médicos, mas não é assim. Toda a sociedade tem direito a saber as linhas com que se cose. Um dos graves defeitos da assistência médica, - claro que há muitas e dignas excepções - é a sua concepção errada a muitos níveis, e que leva a uma quase total ausência de um exercício clínico profundo, sábio e correcto, fora de um âmbito hospitalar credível. Daqui, a medíocre observação clínica de um doente, a avaliação clínica tantas vezes atamancada e a abordagem vulgarmente negligente e irresponsável da situação do paciente, impedindo qualquer diagnóstico ou linha de orientação eficaz, redundando em prescrições disparatadas e exames dispendiosos, muitas vezes nefastos e até mortais.

Vem tudo isto a respeito do doente idoso, isto é, aquele doente com mais de 65 anos, a dita terceira idade. Este doente é muito diferente do indivíduo jovem. É mais atingido por doenças, especialmente doenças crónicas, tem várias comorbilidades, (cerca de 53,8% têm cinco ou mais doenças crónicas). Além disso, as alterações fisiológicas próprias da idade são muitas, desde as alterações no funcionamento do tubo digestivo, do fígado, do rim, dos órgãos endócrinos, do sangue, da actividade psíquica, levando a alterações da absorção, do metabolismo e da excreção de substâncias.

Chegado ao ponto fulcral e intencional deste pequeno texto, eu queria dizer que quando há necessidade de prescrever um medicamento a uma pessoa idosa, os principais problemas prendem-se, como sugere um artigo da Dra. Lèlita Santos, com as patologias não tratadas, com a patologias mal tratadas, com a não indicação dos tratamentos e fármacos adequados ou com prescrições erradas, com a polimedicação, coma a não adesão, com o baixo nível de instrução, as fracas condições sociais e económicas, e, sobretudo com as reacções adversas aos medicamentos e as interacções medicamentosas, quer interacções fármaco-doença, quer interacções fármaco-fármaco. O idoso tem duas a três vezes mais probabilidades de sofrer uma reacção adversa do que um jovem. Há vários estudos que provam que um idoso a tomar vários medicamentos tem grandes probabilidades de interacções medicamentosas, reacções mais graves e com mortalidade duas vezes mais elevada do que em pessoas mais novas.

Neste drama da terceira idade, porque de um drama se trata, essencialmente por passar à margem da responsabilidade e do bom senso, centra-se um dos maiores defeitos e um dos mais graves problemas do SNS a nível periférico, extra-hospitalar, e, logicamente, da assistência privada, não a que é praticada por profissionais competentes, obviamente, mas a que se faz em muitas dessas clínicas, quase de vão de escada, que por aí proliferam. A ignorância, a incompetência e a falta de juízo crítico e clínico, estão na base da grande morbilidade e mortalidade produzidas pelas disparatadas intervenções e medicamentações, prescritas sem qualquer critério válido.

Sabendo que a terapêutica medicamentosa no doente idoso requer cuidados especiais, foram criados diversos instrumentos para avaliação do uso de medicamentos inapropriados e contra-indicados, permitindo a criação de um método que auxilie o médico na escolha de remédios e na ponderação das doses a ministrar, perante cuidada avaliação das funções vitais e de parâmetros analíticos. Para além dos Critérios STOPP/START que surgiram como uma resposta europeia aos problemas dos índices disponíveis para medir a inadequação potencial da prescrição aos doentes idosos, existem os Critérios de Beers, constituídos por dois quadros, um incluindo uma grande lista de substâncias a evitar nos doentes idosos e outro contendo diversas situações clínicas e os remédios a evitar nessas circunstâncias. Em suma, o que pretendem estes critérios é aconselhar a não utilização de medicamentos não recomendados em idosos, evitar medicamentos de venda livre, evitar remédios cujo benefício não seja claro, evitar medicação potencialmente perigosa ou desnecessária, independentemente do diagnóstico ou da condição clínica, tudo isto para evitar o alto risco de efeitos colaterais, por vezes muito nefastos.

A triste conclusão surge no seio daquilo que nós vemos todos os dias, a polimedicação irracional. Por outro lado, a utilização dos medicamentos que todos estes critérios reprovam e desaconselham é… mato. Daí que uma grande fatia das doenças dos idosos e até da sua mortalidade seja devida aos remédios.

 

(in Revista da Ordem dos Médicos, Janeiro de 2013)

 

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por Augusta Clara às 15:00



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