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Delícias são tudo o que nos faz felizes: um livro, a magia dum poema ou duma música, as cores duma paleta ... No jardim o sol não raia sempre mas pulsa a vida, premente.
José Goulão "O presente de Deus" a Erdogan
Mundo Cão, 16 de Julho de 2016
O presidente da Turquia, Recep Payyp Erdogan, afirma que a tentativa de golpe militar de sexta-feira foi um “presente de Deus”: vai permitir-lhe “limpar” as forças armadas.
Quem fala verdade não merece castigo, pelo que todos os deuses evitarão punir o autocrata turco, embora sabendo que muitos são os seus pecados.
E “limpezas” são a especialidade deste padrinho e protector de uma miríade de grupos de mercenários e terroristas entre os quais se destacam, para os que não estão lembrados ou o ignoram, o Daesh ou Estado e Islâmico e a Al-Qaida nos seus muitos e variados heterónimos.
Limpou o país da oposição, acusando os principais adversários de servirem os direitos nacionais curdos e ameaçando privá-los da nacionalidade turca. Para que não surgissem obstáculos à sua ascensão ao topo presidencial do poder fez manipular actos eleitorais através da propaganda, da censura e do medo, de tal modo que nem os observadores do Conselho a Europa e da OSCE, embora reconhecendo as irregularidades em privado, ousaram torná-las públicas e definitivas.
Limpou o aparelho judiciário e militar saneando centenas de juízes e os procuradores que denunciaram a corrupção governamental e da família Erdogan, designadamente a sua familiaridade pessoal e financeira com o banqueiro saudita Yassim al-Qadi, próximo de Bin Laden e conhecido internacionalmente como “o tesoureiro da Al-Qaida”. Por essa razão, está sob a mira da ONU, o que não o impede de deslocar-se a Ancara em avião privado para conviver e gratificar generosamente a família presidencial.
Vem limpando paulatinamente as forças armadas, mas este “presente de Deus”, como admitiu o próprio Erdogan, proporciona-lhe uma oportunidade de ouro para acelerar o processo. A partir de agora ruirá o maior obstáculo secular à confessionalização de um regime turco formatado em estrutura ditatorial e em teor fundamentalista islâmico.
Erdogan fala claro, disso não tenhamos dúvidas. Há 20 anos, em plena ascensão na carreira política, iniciada entre os fascistas e supremacistas “lobos cinzentos”, definiu a democracia como “um eléctrico que abandonamos quando chegamos à nossa paragem”. Recentemente falhou a consulta para impor uma Constituição “inspirada em Hitler” – as palavras são suas – de modo a consolidar um poder presidencial absoluto.
A seguir a esse intuito por ora fracassado, Erdogan começou então a receber “presentes de Deus”.
O atentado contra o aeroporto de Istambul parece ter sido um deles. Apear da autoria não ter sido reivindicada, Erdogan atribuiu-o ao Daesh, por conveniência da sua própria imagem internacional; mas por que razão os protegidos iriam atacar no coração do protector? Provavelmente por convergência de interesses – uma mão lava a outra, não é o que se diz? Um atentado é, sem dúvida, oportunidade de ouro para reforçar poderes de excepção e perseguir inimigos internos vários, mesmo que nada tenham a ver com a violência.
Quando ainda decorre o rescaldo do acto terrorista surge o golpe militar, com inegáveis debilidades de amadorismo num exército dos mais poderosos da NATO, precisamente com Erdogan ausente, “de férias”, circunstância excelente para um regresso triunfal, afirmativo, justificando limpezas. Deus não poderia ter sido mais generoso, em boa verdade.
Enfim, é a este ditador turco que a União Europeia paga anualmente três mil milhões de euros confiscados aos nossos impostos para impedir que cheguem à Europa os refugiados das guerras que os donos da Europa provocam. Para que conste, não há um vínculo formal entre o conselho Europeu e Erdogan sobre esta verba; foi estipulada apenas em comunicado de imprensa dos chefes de Estado e de governo da União Europeia.
Foi com este presidente turco que o governo francês negociou a garantia de não haver atentados do Daesh durante o Euro 2016, em troca do apoio à criação de um Estado curdo no Norte da Síria. Constatámos, da maneira mais trágica, que ao Daesh bastaram apenas quatro dias para se libertar do período de nojo, fazendo gato-sapato do securitarismo fanático e inconsequente de Hollande e Valls.
É a este presidente turco que a União Europeia ainda reconhece credenciais de democrata, apesar de o próprio rei Abdallah da Jordânia ter revelado o seu apoio ao Daesh, à Al-Qaida, ao contrabando de petróleo que serve de financiamento ao Estado Islâmico e de enriquecimento à mafia familiar de Erdogan.
Foi comovente – e patético – o apoio de grande parte da comunidade mediática a Erdogan durante as vicissitudes da tentativa de golpe e ao uso dos seus apoiantes como escudos humanos e carne para canhão nas ruas, praças e pontes das principais cidades da Turquia.
Entre a componente militar e a mafia governamental de Erdogan estavam em luta, durante a tentativa de golpe, dois conceitos de regime autoritário: um secular, outro fundamentalista islâmico. A democracia e os interesses populares não tinham nada a ver com aquela guerra entre elites interesseiras e pouco ou nada preocupadas com as pessoas.
O terrorismo islâmico, a guerra e a anarquia no Médio Oriente, porém, têm muito a ganhar com a absolutização do poder de Erdogan em Ancara. Ou seja, é impossível estar simultaneamente contra o terrorismo islâmico e temer pelo futuro político de Erdogan. A democracia não passa por aí, mas também já pouco se sabe dela nesta União Europeia.
Porém, quando a vida das pessoas está à mercê destes “presentes de Deus” é possível testemunharmos os acontecimentos e os ditos mais bizarros.
Helder Costa O Cherne espantou a caça
E, de repente, alguém da Europa decidiu que o que é demais não presta. Políticos, jornais, todos se indignam com o cherne Durão se acoitar nas profundezas ( não esquecer que ele é um peixe de águas profundas) do tal Banco- maravilha Norte - Americano, o Golden Sachs.
Mas só agora é que repararam no tal Moedas de falsa moeda, no equilibrista Arnault, nos Gaspar , Marilu Albuquerque, no reptilineo Portas, no sempre coerente comportamento do Cavaco apoiando as sanções contra ESTE governo, e mais bicheza mais ou menos miúda que tem andado desde sempre ao serviço dos imperialismos vários que nos sugam o sangue?
A questão é : que fazer com esta indignação?
Pedir que o Barroso se arrependa e " não aceite" o convite???
Mas qual convite?esse plano foi projectado há muitos anos. Desde que como 1º ministro convidou esse Banco para assessoria, depois foi o porteiro da guerra do Iraque compensado com o cargo da Comissão europeia!!, e assim segue a sua brilhante carreira.
Em plena impunidade, com um sólido guarda-chuva associal protector destas palavrinhas e indignações.
Claro que um regime Republicano poderia levar a julgamento toda esta cambada com a simples acusação Novecentista de lesa- Pátrias. Recuperando parte dos roubos descarados e fundamentalmente recuperando a honra do país.
A caça saiu da toca e volta à pressa para a gruta. Nunca fizeram nada, nem nunca farão.
Não estou a falar de esquerdismos nem de Revoluções. Estou unicamente a recordar intelectuais e politicos como Victor Hugo, Jean Jaurés, Antero de Quental, Raul Proença, Ortega e Gasset, Bertrand Russell...gente antiga, gente fora de moda.
Adão Cruz Dentro dos meus olhos
(Adão Cruz)
Dentro dos meus olhos uma tela azul enorme grande como a
luz dos teus olhos onde meti todo o céu que pude
Um mar imenso de mil cores mil jardins de flores à minha
escolha ao critério dos meus dedos ao sabor dos meus
segredos e dos medos de não ser capaz
Azul e mais azul de amarelo fustigado um rasgo genial de
vermelho um reflexo de sol e de céu
Mas tu não gostas de poetas mortos nada te dizem as cores
da minha mão se tento escrever‑te numa tela ou pintar teu
rosto na letra de um verso
Não gostas de poemas nem queres puxar os cordéis das
minhas pernas em sentido de fuga
Não deixas abrir as janelas do vagaroso comboio carregando
ruas estreitas e novas lojas de palavras velhas
Nas estreitas ruas das minhas mãos há longuíssimas raízes
que te prendem a um labirinto de espelhos
Grande como o céu não sei pintar‑te assim
Vou recriar‑te dentro de mim numa fusão de quadros
brancos sem passado sem palavras sem fundo e sem fim
(in Adão Cruz, VAI O RIO NO ESTUÁRIO. Poemas de braços abertos, ediçõesengenho)
Clara Cruz (7 anos), 2016
Estará a nascer uma artista na nova geração da família Cruz? O tempo o dirá mas, para começar, não se saiu nada mal.
Adão Cruz Mãe
(Adão Cruz)
Mãe a palavra universal a palavra mais consensual da
humanidade
Nem Deus… Deus é de uns e não de outros Deus é conceito de
muitos e negação de outros tantos
A mãe não a mãe é de todos sem excepção
A mãe é de todos e é só nossa a mãe é do crente e do ateu a
mãe é do pobre e do rico do sábio e do ignorante
A mãe é dos poetas dos filósofos e artistas dos bons e dos
maus a mãe é do amigo e do inimigo
Não há mãe de uns e não de outros não há ninguém sem
mãe não há mãe de ninguém
A mãe é de toda a gente a mãe é de cada um a mãe é do
mundo inteiro e do nosso mais pequeno recanto
A mãe é do longe e do perto da água e do fogo do sangue
e das lágrimas da alegria e da tristeza da doçura e da
amargura da força e da fraqueza
A mãe é certeza e aventura é medo e firmeza dúvida e
crença a haste que se ergue no céu ou se aninha rente ao
chão para que a morte a não vença
A mãe é a outra parte de nós
Sem mãe somos metade sem mãe nada é exacto igual a um
igual a infinito onde se tocam princípio e fim onde os tempos
se encontram sem tempo presente passado e futuro
A mãe é tudo a mãe é de mais a mãe é o máximo
A mãe é a lágrima que não seca no sorriso que não se apaga a
nuvem que chove no sol que aquece a mensagem da luz e da
harmonia e dos acordes matinais com que abre o nosso dia
A mãe levanta‑se no orvalho das lágrimas da noite e mesmo
cansada não perde a voz nem a cor da madrugada
A mãe é a voz que se não teme a voz que se confia a voz que
tudo diz nas consoantes do grito nas vogais do silêncio nos
abismos da agonia
Mãe
Primeira palavra a nascer a última palavra a morrer a mãe
é sempre a mesma a mãe nunca é outra na sua infinita
diferença
A mãe é criação a mãe é sempre o fim da obra‑prima
inacabada a mãe nunca é ensaio nem esboço nem projecto
A mãe é um milagre no milagre do mundo o único milagre
concebido neste mundo real e concreto
Chora para que outros riam ri para que a dor a não mate
mistura‑se com a luz das estrelas para vencer a escuridão
devora as nuvens por um raio de sol
A mãe é beleza e poesia aurora fulgurante aurora
adormecida a mãe é bela porque é simples a mãe é simples
porque nasce da silenciosa lógica da vida
A mãe é o que é a mãe é a fragilidade da semente a força do
tronco a beleza da flor a doçura do fruto o dom de renascer
A mãe é tudo numa coisa só
Amor
(in Adão Cruz, VAI O RIO NO ESTUÁRIO. Poemas de braços abertos, ediçõesengenho)
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Texto e foto deliciosos, parabéns!
Palavras como dinamite.E passados 50 anos sobre os...
Lindo!
Um testemunho enternecedor.Eva
Grande texto que nos faz refletir... Muito!