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Jardim das Delícias



Quinta-feira, 30.11.17

A morte do poeta - Adão Cruz

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Adão Cruz  A morte do poeta

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(Adão Cruz)

O dilema entre o silêncio e a palavra invade a lógica discursiva que há no ridículo do poema.

Quem tudo vê e nada sabe ou é poeta ou patético peregrino da teatral mentira que emoldura a poesia mascarada nos buracos negros das palavras.

Morre a razão e a mente no espaço vazio do poeta engolido nas areias movediças da estupidez do verso. 

Nasce a poesia na semântica farsa das palavras escondida nos simbolísticos restos do dilema entre o silêncio do mundo caído em pedaços ou erguido nos absurdos de um poema.

Ninguém conhece a metáfora da verdade e da mentira, só o poeta, na sua indomável vertigem da ilusão, assim descobrindo a poesia nos avessos da razão.

Morre o poeta em suas manhãs de pedra e gelo entre a verdade da mentira e a mentira da verdade, e todos lhe cobrem o corpo com lençóis de pétalas e sedução, primeiro e último poema do silêncio e da razão.

 

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por Augusta Clara às 14:00

Terça-feira, 28.11.17

A árvore onde estivemos - Adão Cruz

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Adão Cruz  A árvore onde estivemos

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(Adão Cruz)

 

Está seca e nua a árvore onde estivemos, nem verde botão de primeira folha

nem rebentos de céu dentro de nós.

Naquela tarde de palavras e raízes da árvore que nos viveu quis o rio nascer nos braços do estuário, quis a terra ser o leito onde a infância adormeceu.

Está seca e nua a árvore onde estivemos no calor dos lábios da ilusão, não tem folhas de primavera nem frutos de verão nem brisas inocentes tremulando por entre os ramos.

Tem restos de poemas secos pendurados nos braços negros e versos apodrecidos pelo chão e vozes mudas que ligam a noite às folhas mortas de solidão.

Está seca e nua a árvore onde estivemos, crestada pela geada e pelo frio de ser tão fria a madrugada.

No silêncio da utopia e na triste melancolia, a árvore onde estivemos secou e com ela a poesia.

 

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por Augusta Clara às 14:00

Segunda-feira, 27.11.17

A voz ao longe - Adão Cruz

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Adão Cruz  A voz ao longe

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(Adão Cruz)

 

Quase diríamos que as paredes brancas nascem da terra.

Quase diríamos que o sol vermelho e quente é um beijo ardente na misteriosa face da planície inocente.

Quase diríamos que a vida não se inscreve nas copas dos chaparros quietos e mudos antes se deita na sombra doce.        

Quase diríamos que o chão se veste e reveste de cores, cheiros e sentidos que dão à vida algum sentido.

Quase diríamos que a vida não se aninha na erva daninha, antes baloiça de alegria no ondular da seara como navio de esperança num mar de trigo.

Quase diríamos que a voz ao longe não é do vento nem do tempo nem da descrença de um outro amanhã.

Quase diríamos que a voz ao longe é o voar sereno de uma nuvem branca, trazendo no bico um livro enorme e um ramo de paz para o ninho dos homens.

 

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por Augusta Clara às 14:00

Sábado, 25.11.17

Botão-flor da primeira folha verde - Adão Cruz

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Adão Cruz  Botão-flor da primeira folha verde

 

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(Adão Cruz)

 

 

Há uma mulher de alvor azul, com um fio de azeite nos lábios finos e uma gota de água no canto dos olhos secos.

Os lábios foram carnudos e vermelhos de sangue, e os olhos eram verdes como o sol, quando o sol era verde.

Tem o rosto sumido na sombra descaída ao longo dos braços, como vela despregada de navegar.

Outrora, o mar encapelado e nu brilhava nos seus olhos, cobrindo de espuma branca as alamedas do desejo.

Havia uma cidade entre os lábios, envolta em lagos de montanha, com peixes verdes voando entre os pinheiros.

Não havia pombas brancas caídas no chão da cidade morta.

Nas ruínas da ilusão, um edifício muito alto erguia-se nas paredes do deserto e rompia o céu de nuvens negras.

No vão da noite que acolhe os sonhos, o botão-flor da primeira folha verde inverteu a vida entre o real e o imaginário nas dobras do tempo em universal dilema.

Há uma mulher de alvor azul com um fio de azeite nos lábios roxos e uma gota de água gelada no canto dos olhos, mas cedo se fez tarde a madrugada sem tempo para morrer na vida de um poema.

 

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por Augusta Clara às 14:00

Sexta-feira, 24.11.17

Adão Cruz, 2017

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Adão Cruz

 

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por Augusta Clara às 16:47

Sexta-feira, 24.11.17

Morreu a esperança - Adão Cruz

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Adão Cruz  Morreu a esperança

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(Adão Cruz) 

 

Não tem sonhos nem lhe bate o coração, invernosa e nua, não a beija o sol nem a paz da lua.

Batida pela chuva e varrida pelo vento agreste, senta-se nos bancos vazios dos jardins a ver passar os homens que procuram encontrar-se a ver mulheres que descarnam outros fins.

Já não chega ser gente de cansaço e solidão, sem manhãs de luz nem flores brancas nascendo da erva mansa, nem o despertar das sombras adormecidas, nem um raio de sonhadora esperança.

Na noite pegada ao corpo de tantos rostos saqueados, de tantas mãos caídas de tantos sonhos amputados, o punho cerrado não vive aqui.

Morreu a esperança, despojada e nua, invernosa e fria.

Esqueceu a primavera e o gume quente do verão, perdida nos escuros recantos do fim do dia.

 

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por Augusta Clara às 16:19

Segunda-feira, 20.11.17

Ouarzazate (Secreta ironia) - Adão Cruz

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Adão Cruz  Ouarzazate (Secreta ironia)

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(Adão Cruz)

 

 

As franjas da memória abrem-se na manhã fria da solidão como torvelinho de água nas despojadas pedras do tempo.

Eis que nos damos conta de uma longa viagem a qualquer cidade para lá do horizonte, quando um mar de cal viva queima os sentimentos no estribo de um velho comboio sem princípio nem fim.

Eis que nos damos conta das lágrimas contidas por um mar de cinza que cobre a alegria de viver, quando se apaga o sol que brilha entre as mãos.

Eis que no crescer da angústia uma infinda tristeza afoga a razão, entranhando no sangue a sombra espessa da desilusão.

O coração tomba perdido na poeira da cidade, preso à orla do deserto de Ouarzazate como criança sem asas.

Na terra sem trilhos e sem regresso aos olhos onde se abre o sorriso de todas as manhãs, eis que nos damos conta de não fazermos parte do mundo.

E cai o sofrimento no profundo silêncio das noites sem nome, suspensas das estrelas.

E resta a saudade, ardendo em fogo lento como ramo seco da primeira folha verde.

 

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por Augusta Clara às 17:13

Domingo, 19.11.17

PIERRE BONNARD, A long time alone

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A long time alone  Pierre Bonnard

 

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por Augusta Clara às 17:16

Sexta-feira, 17.11.17

Venho de um jardim distante - Adão Cruz

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Adão Cruz  Venho de um jardim distante

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(Adão Cruz)

 

Venho de um jardim distante florido de memórias ou de um sonho qualquer
entre risos e lágrimas caindo de um céu de chumbo ou de um céu de magnólias.
Venho do seio do orvalho da madrugada num punhado de vida libertada em qualquer rumor de passos brincando nos telhados acesos pela luz do dia....
Venho de um jardim distante onde grinaldas de flores abrilhantam a festa do azul dos tempos no incêndio do crepúsculo ou no ardor da manhã do meu berço de mistério e universo.
Venho das esquinas do tempo em recordações avulsas ao sabor das pontes da vida cavalgando o vento que assobia nas ruas estreitas ou mordendo as pedras com punhais de silêncio.
De onde venho ninguém sabe.
Venho talvez da intimidade salgada do mar ou de um jardim distante com um rio de passos e palavras e pedaços de sol num rosário de pérolas abrindo a neblina do nascer da vida.
Venho… quem sabe da nudez adormecida no silêncio do tempo destinado à simplicidade da morte pelo sinuoso caminho das recordações perdidas no chão fundo das angústias ou nos retalhos da esperança.

Venho talvez das sombrias entranhas prenhes de fulvos e ilusórios tesouros que emergem do fundo do mar sublimados de cor e luz à superfície traiçoeira das águas bordadas de espuma.
Ou então…
Ou então serei filho de um mundo sem resposta sujeito a ventos e marés que enrugam o latejar das veias e quebram o voo das artérias com lugar no corpo rompendo o fluir da vida no interior do sonho.
Não.
Eu não venho de lugar algum fora da mente nem trago comigo a erva daninha.
Eu venho de um jardim distante entre o sonho e a razão onde o pensamento se agiganta contra as trevas e a ilusão.

 

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por Augusta Clara às 15:39

Quinta-feira, 16.11.17

Adão Cruz, 2017

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Adão Cruz

 

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por Augusta Clara às 17:07

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