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Delícias são tudo o que nos faz felizes: um livro, a magia dum poema ou duma música, as cores duma paleta ... No jardim o sol não raia sempre mas pulsa a vida, premente.
BEGENE
Esta velhota, fumadora de cachimbo, veio um dia ter comigo porque tinha o “Verme-da-Guiné”. Chamávamos a este verme “Dracontia”. Embora Dracontia seja o nome de uma das vinte e cinco mil espécies de orquídeas, aqui é um parasita denominado “Dracunculus Medinensis” o qual produz uma doença chamada “Dracunculíase”. Pertence ao grupo das “Filarias” e é um parasita que é transmitido pela água infectada com larvas de Dracunculus. No intestino acasala-se com os machos, que depois morrem, e em seguida infiltra-se na pele, no tecido celular subcutâneo ( gordura debaixo da pele), onde cresce e se desenvolve, podendo atingir o tamanho de um metro. Aloja-se em qualquer parte do corpo, mas aparece sobretudo nas pernas e abdómen. Não tem tratamento, podendo causar graves infecções e processos inflamatórios. Vi alguns casos, e felizmente todos bem sucedidos, graças a uma técnica que alguém inventou, e quem a inventou, não há dúvida que “tinha esperto no cabeça”. Reparem bem na maravilha desta invenção. O parasita vem pôr os ovos (um a três milhões) quando está dentro de água. Para isso abre um pequeno orifício ulceroso e muito doloroso, onde enfia uma espécie de cabeça, semelhante ao escolex da ténia. Nesta mulher, essa úlcera estava na parte interna da perna, logo acima do tornozelo. Então, com uma pinça, agarra-se a cabeça, puxa-se suavemente para fora alguns centímetros (nunca por nunca partir ou romper, pois dessa forma fica o caldo entornado e nunca mais o conseguimos tirar), e enrola-se num palito, fixando-o à perna com adesivo. Ao outro dia, como o verme se sente preso, sai um pouco mais para o exterior e enrolamos mais uns centímetros, fixando de novo com adesivo. E assim sucessivamente, todos os dias, até sair por completo, o que pode levar semanas. Associamos alguma medicação analgésica, anti-infecciosa e anti-inflamatória.
Em 1986 havia cerca de 3,6 milhões de casos. Nesta altura, o Verme-da Guiné, existente em muitos outros países, está praticamente erradicado.
Eva Cruz Fleurs de Rocailles
(Adão Cruz)
“Scent of a Woman”, fragrância exalada de flores de jasmim, de cravo, lírio do vale, violeta que eleva os sentidos à frescura e à beleza dos campos e os enche daquela plenitude indefinível que perdura e leva a acreditar que o céu é feito de perfume.
Foi no Musée du Parfum no centro de Paris que recebi o meu primeiro perfume “Fleurs de Rocailles”, tinha eu dezoito anos, e que guardei religiosamente durante uma vida. Um frasquinho pequenino, esguio, da Caron, criado em 1933. Musée du Parfum ou Fragonard Musée, em homenagem ao pintor hedonista Fragonard do século XVIII da cidade de Grasse, dos campos de lavanda, do ouro azul, abertos ao infinito, que perfumam as terras provençais, paisagens mágicas que seduziram poetas, escritores, pintores como Van Gogh, Cézane, Picasso, Camus e tantos outros artistas, que por ali encheram a alma de alfazema, rosas, lírios e jasmins.
“Fleurs de Rocailles”, quase no fim de “ PERFUME DE MULHER”, mostra bem, sobretudo a partir do olfacto apurado de um cego, o coronel Frank Slade, que um bom perfume é mais do que um cheiro, é parte integrante de uma personalidade.
Como o sofrimento interior pode escamotear a bondade, aprendeu-o até ao desespero o jovem e inexperiente estudante Charlie, aluno de um dos Colleges da Universidade de Princeton. A abnegação e a força da amizade irascível de um amante dos prazeres da vida em todos os sentidos criaram em Frank, durante uma curta viagem a Nova York para celebrar o feriado de três dias do Thanksgiving , de Acção de Graças, o novo sentido da vida e a utopia dos últimos sonhos. Charlie, com a frescura virgem e pueril da sua bondade e compaixão enternecedoras, abriu-lhe o caminho para o alento e para um novo sentido e uma nova força de viver, traduzido no arrebatamento estonteante e pungente de um tango dançado por um cego à volta de um etéreo perfume.
A dramática beleza da violência poética, terminando com uma preciosa lição sobre a força da escola na estruturação do carácter, pôs a nu a hipocrisia de muitas escolas de elites, onde o dinheiro é deus e senhor, mais empenhadas no amestramento, como paradigma do cidadão formatado para o sistema, do que na educação de gente com coluna vertebral.
A referência a “Fleurs de Rocailles” perfumou-me inesperadamente a memória e caiu como um bálsamo nas minhas longínquas lembranças, fazendo-me recuar ao “Scent of a Woman” dos meus dezoito anos.
CANQUELIFÁ
Eu estou à direita na foto. À minha direita o filho do Régulo, a seguir o alferes Duarte e depois o Anso, chefe da milícia negra, que segundo constou foi fuzilado após a independência.
A Meswuit
A Sé Catedral
O sino era uma jante de carro
Os dois gémeos, filhos do Anso, duas perolazinhas negras com quem eu, por vezes, me entretinha.
À entrada da palhota do Régulo, que muitas vezes me convidava para beber qualquer coisa com ele.
O Régulo, de óculos. Régulo do Pachisse ou Pachisi, não sei bem, uma região do Gabu Sara que nunca consegui definir ao certo.
Adão Cruz GUERRA DA GUINÉ – 1967. BEGENE - O nosso corpo clínico
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Porto é melhor que Benfica, isto é uma prova clara
Magnífica verdade,"[...] que viver dos outros impl...
Obrigada! Texto maravilhoso a ler e reler! Desde p...
Muito interessante este texto do Raul Brandão. Que...
Desculpe, mas isto é demasiado grande para ser o c...