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Delícias são tudo o que nos faz felizes: um livro, a magia dum poema ou duma música, as cores duma paleta ... No jardim o sol não raia sempre mas pulsa a vida, premente.
PALESTINA
QUEM VIVEU 60 ANOS DE EXERCÍCIO DA MEDICINA A TENTAR SALVAR VIDAS E FEZ DUAS DÉCADAS DE CUIDADOS INTENSIVOS, QUEM NÃO DORMIA COM A HIPÓTESE DE TER DE DESLIGAR UMA MÁQUINA DE SUPORTE DE VIDA, QUEM TANTAS VIDAS TENTOU RESSUSCITAR NA FRONTEIIRA DA MORTE, NÃO CONSEGUE ENTENDER NEM SEQUER IMAGINAR A TAMANHA BRUTALIDADE, A TÃO MEDONHA BESTIALIDADE E TÃO MONSTRUOSA E INCONCEBÍVEL REALIDADE....DE UM ASSASSINO CORTE DE ENERGIA.
Lista de palestinianos mortos pelo exército de Israel ontem, 14 de Maio de 2018
Ezz el-din Musa Mohamed Alsamaak, 14 years old
Wisaal Fadl Ezzat Alsheikh Khalil, 15 years old
Ahmed Adel Musa Alshaer, 16 years old
Saeed Mohamed Abu Alkheir, 16 years old
Ibrahim Ahmed Alzarqa, 18 years old
Eman Ali Sadiq Alsheikh, 19 years old
Zayid Mohamed Hasan Omar, 19 years old
Motassem Fawzy Abu Louley, 20 years old
Anas Hamdan Salim Qadeeh, 21 years old
Mohamed Abd Alsalam Harz, 21 years old
Yehia Ismail Rajab Aldaqoor, 22 years old
Mustafa Mohamed Samir Mahmoud Almasry, 22 years old
Ezz Eldeen Nahid Aloyutey, 23 years old
Mahmoud Mustafa Ahmed Assaf, 23 years old
Ahmed Fayez Harb Shahadah, 23 years old
Ahmed Awad Allah, 24 years old
Khalil Ismail Khalil Mansor, 25 years old
Mohamed Ashraf Abu Sitta, 26 years old
Bilal Ahmed Abu Diqah, 26 years old
Ahmed Majed Qaasim Ata Allah, 27 years old
Mahmoud Rabah Abu Maamar, 28 years old
Musab Yousef Abu Leilah, 28 years old
Ahmed Fawzy Altetr, 28 years old
Mohamed Abdelrahman Meqdad, 28 years old
Obaidah Salim Farhan, 30 years old
Jihad Mufid Al-Farra, 30 years old
Fadi Hassan Abu Salmi, 30 years old
Motaz Bassam Kamil Al-Nunu, 31 years old
Mohammed Riyad Abdulrahman Alamudi, 31 years old
Jihad Mohammed Othman Mousa, 31 years old
Shahir Mahmoud Mohammed Almadhoon, 32 years old
Mousa Jabr Abdulsalam Abu Hasnayn, 35 years old
Mohammed Mahmoud Abdulmoti Abdal’al, 39 years old
Ahmed Mohammed Ibrahim Hamdan, 27 years old
Ismail Khalil Ramadhan Aldaahuk, 30 years old
Ahmed Mahmoud Mohammed Alrantisi, 27 years old
Alaa Alnoor Ahmed Alkhatib, 28 years old
Mahmoud Yahya Abdawahab Hussain, 24 years old
Ahmed Abdullah Aladini, 30 years old
Saadi Said Fahmi Abu Salah, 16 years old
Ahmed Zahir Hamid Alshawa, 24 years old
Mohammed Hani Hosni Alnajjar, 33 years old
Fadl Mohamed Ata Habshy, 34 years old
Alexandra Lucas Coelho A marcha pelas nossas vidas em Gaza
SAPO24, 30 de Março de 2018
O mundo viu a cara de Emma Gonzalez. No mesmo exacto dia, estudantes revoltavam-se em Gaza. Saem de casa para a escola a cada dia, marcham pela sua vida todos os dias. Espero o dia em que a América, e o mundo, também se possam ver na cara deles.
1. A América em luto viu-se na cara de Emma Gonzalez. A América em choque desde a eleição de Trump viu-se na cara de Emma Gonzalez durante seis minutos e vinte segundos, o tempo que o atirador da Florida levou a matar 17 pessoas. Essa América respirou com ela, sofreu com dela, chorou com ela, lágrimas rolando em silêncio, perante meio milhão de pessoas ali em Washington, perante o mundo. Quando Emma Gonzalez saiu do palco, a América tinha um ícone para o futuro, um perfil do Monte Rushmore. A nova estrela da América, ou a estrela da nova América era mulher, bissexual, 18 anos, cabelo rapado, cara lavada, a pele escura dos latino-americanos, o apelido de quem descende de outra América, mais abaixo (no caso dela, Cuba). Go Emma, we love you, tinham gritado jovens na assistência, ao todo dois milhões de americanos nas ruas de várias cidades contra a violência das armas, pelas suas vidas. Emma Gonzalez era o épico de um tempo, este tempo, a coisa mais poderosa que acontecia na América desde a eleição de Donald Trump. Seis minutos e vinte segundos de cinema, feito na América, pela América, essa utopia de uma só palavra na voz de Walt Whitman (America // Centre of equal daughters, equal sons…)
Aconteceu sábado, em directo dos Estados Unidos da América.
2. Por assombrosa coincidência, nesse mesmo dia, nesse mesmo sábado, houve uma revolta de estudantes na Faixa de Gaza. Um sit-in disperso à bastonada pela polícia local. Não soube disso em tempo real, como em tempo real soubemos de Emma em Washington, e todos os seus colegas que iniciaram o movimento #neveragain, propulsionando a histórica March For Our Lives de 24 de Março. Soube por um email quatro dias depois, do Palestinian Center of Human Rights (PCHR), um centro baseado em Gaza que conheço há bastantes anos, e regularmente envia relatórios da situação na Faixa para os seus contactos em todo o mundo. Há pouquíssimas notícias de Gaza, há muitos poucos jornalistas em Gaza a reportar para fora, então os relatórios do PCHR são pelo menos um vislumbre regular.
Esse email contava:
“De acordo com informação obtida pelo PCHR, a administração da Universidade al-Azhar anunciou dia 21 Março de 2018 a decisão de impedir qualquer estudante masculino ou feminino de entrar nas salas de exame sem pagar as propinas. Centenas de estudantes recusaram a decisão por as famílias não terem meios de fazer o pagamento, dada a deterioração das condições económicas e sociais [na Faixa de Gaza]. Na manhã de sábado, 24 de Março 2018, centenas de estudantes protestaram dentro do campus da universidade contra a decisão, causando altercações entre os estudantes e os empregados. A Segurança da Universidade interveio para dispersar o sit-in. Os acontecimentos precipitaram-se e agentes do Serviço de Polícia Palestiniana intervieram, chamados pela Administração da Universidade. Os agentes dispersaram o sit-in, e dezenas de estudantes ficaram feridos, depois de serem espancados com bastões. A polícia deteve também vários estudantes e um fotojornalista, Mahmoud Zo'abor, que trabalha para a al-Hadaf News, após um homem, que se identificou como sendo do Ministério do Interior, confiscar a câmara e o telemóvel do jornalista [foram mais tarde libertados].” Cheguei entretanto a outras, breves, notícias que confirmam a tensão estudantil em Gaza nas últimas semanas.
E pensei nos rapazes e nas raparigas da universidade al-Azhar com quem estive em Maio passado, lá em Gaza. Valerá a pena algum contexto, para perceber melhor o que está a acontecer agora.
3. O pedacinho de orla que é Gaza (40 quilómetros de comprimento por seis a dez de largura) tem dois milhões de pessoas lá dentro, literalmente presas há décadas, como o mundo sabe. Literalmente presas quer dizer: impedidas de sair. Não há metáfora. E não há nada, mas nada, que se compare a isto em todo o planeta
Desses dois milhões de pessoas 66 por cento têm menos de 25 anos. Ou seja, dois terços dos habitantes daquela prisão única são jovens. Pensem em todos os jovens que viram pela TV nas ruas dos EUA, sábado passado. Em Gaza são mais. E o desemprego, que em Gaza está em 50 por cento, é mais alto ainda entre os jovens. Centenas de milhares de rapazes e raparigas que literalmente, sem metáfora, não têm saída. E, além de não terem forma de sair, fisicamente, nem terem trabalho quando acabam de estudar, não têm um único cinema, já quase não têm música ao vivo, não têm água potável nas torneiras, não têm electricidade 20 horas por dia, nem podem ser bissexuais, gays, trans, intersexo, sob risco, real, de serem mortos (no ano anterior, o Hamas executara um seu comandante, alegadamente condenado por roubo e “sexo homossexual”).
Em Maio, conversei com mais de uma dezenas destes estudantes junto à universidade da Cidade de Gaza onde agora os protestos aconteceram. Não dentro do campus, porque isso os podia pôr em risco, chamar a atenção dos empregados, mas nas imediações. Primeiro, com um grupo de rapazes, depois com um gupo de raparigas. Todos usavam as redes sociais: Facebook, Instagram, Snapchat, Twitter. Essa era a janela, o único oxigénio do mundo. Nas três ou quatro horas de electricidade, que são as que restam diariamente, carregavam os telemóveis, e muitas vezes usavam os ecrãs como lanterna para estudar à noite.
E, vendo agora Emma Gonzalez, lembrei-me sobretudo de Rozan, a Rozan de 18 anos que estava ao centro do grupo de universitárias com quem falei, depois dos rapazes. Emma e Rozan têm a mesma idade, um carisma natural, uma força que sabe-se lá de onde vem. Rozan, cuja cara o mundo não conhece, falou-me como uma líder nata. “Somos muçulmanas mas não apoiamos o Hamas”, disse, rodeada pelas colegas, todas de cabelo coberto, todas de telemóvel na mão. “O Hamas passou dez anos no poder aqui, e como estamos? Não há electricidade, não há salários, não há gasolina. Três guerras! Eu tenho 18 anos e vivi uma intifada e três guerras. E ainda uma guerra civil entre Fatah e Hamas. Isto não é vida, é morte. E temos a certeza de que nos vamos licenciar e não encontraremos trabalho.”
Como a esmagadora maioria das pessoas que encontrei em Gaza nessa estadia de 2017 (em reportagem para a “Visão História”), Rozan e os seus contemporâneos sentiam-se duplamente reféns. Primeiro, reféns de Israel, a potência que controla Gaza por terra, mar e ar, a bombardeia regularmente, a sujeita ao mais longo e desumano bloqueio do planeta. Depois, reféns do Hamas, porque os últimos dez anos de poder em Gaza, os dez anos de divisão interna palestiniana são o fruto dramático do cerco israelita. Conheci Gaza em 2002, e fui visitando a faixa ao longo dos anos. Em Maio de 2017, a atmosfera era não só literalmente pútrida, como toda a gente parecia à beira de enlouquecer, e disparara a desconfiança sobre quem serve o quê, quem espia para quem. A gaiola onde Israel fechou os palestinianos chegava ao ponto a que chega uma gaiola nestas circunstâncias. Só que à vista do mundo, e com dois milhões de pessoas lá dentro, em vez de ratinhos.
4. Este é o contexto. O mais espantoso, porém, é que estas centenas de milhares de jovens em Gaza não estão a matar ninguém, nem a fazerem-se explodir, apesar de conhecerem na carne a violência das armas, e das bombas, desde que nasceram. Estão a ir às aulas, estão a lutar pelos seus exames. Estão a marchar todos os dias pelas suas vidas, na verdade, de casa para as aulas, das aulas para casa, de vez em quando para a praia, onde já nem se pode tomar banho sem risco de adoecer, porque é um mar de fezes, porque os esgotos não são tratados, proque não há condições para os tratar, porque o contexto é este. Há décadas. À vista de todos.
Em Outubro, Hamas e Fatah assinaram um acordo de reconciliação, que mal saiu do papel até agora. Não houve eleições, Abbas ainda é aquele presidente da Palestina lá em Ramallah, com quem o mundo fala porque acha que é o único que há, mas em quem os palestinianos não se revêm. O Hamas deu sinais de ter percebido que alguma coisa tinha de mudar, porque a situação em Gaza era insustentável, e a popularidade interna dos islamistas estava em queda, mas o mundo continuou a ter mais em que pensar. Há dias, o primeiro-ministro de Ramallah foi a Gaza inaugurar uma coisa e rebentou um explosivo que atingiu dois carros da sua caravana. Fatah e Hamas puniram-se mutamente, mostrando como é utópica a reconciliação neste contexto.
A partir de hoje, sexta-feira, e até 15 de Maio, quando Israel celebra o aniversário da sua fundação, o Hamas tem cinco acampamentos montados ao longo da fronteira de Gaza com Israel e incentivou a população a manifestar-se, como forma de lembrar o direito de retorno, de assinalar os 70 anos desse 15 de Maio, que para os palestinianos é a Naqba, ou Catástrofe. Israel está a responder com um aparato militar ao longo da fronteira, incluindo atiradores de elite. No momento em que escrevo, sete palestinianos já morreram e há dezenas de feridos.
Isto é Gaza, 30 de março de 2018.
5. Em Fevereiro estive nos EUA, parti no dia em que o atirador da Florida matou os colegas de Emma. Esse dia fez um clique que nenhum outro massacre tinha feito. Dos dois milhões que terão saído à rua no dia 24, quase um terço nunca se manifestara, e havia muita gente que não era adolescente. Outro dado interessante: 70 por cento de mulheres. É bom acreditar que uma nova geração esteja em pé. É bom ver Emma Gonzalez, com tudo o que ela é, arrebatar o mundo. E sim, ser bissexual não é um detalhe sem importância, foi nessa luta que ela se fez também, activista da Gay-Straight Alliance na sua escola. Emma é a primeira a dizer que, para ela, o activismo pelos direitos gay e o activismo contra as armas estão ligados. É a vida dela, com tudo o que ela é, e sem ter percebido quem era não estaria agora ali, dando a cara ao mundo.
Vejo a cara de Emma e penso até que ponto os estudantes que conheci em Gaza a acompanharam, desde o massacre na Florida, eles que seguem tudo pelas redes sociais. Penso como terão olhado para o movimento que se estava a formar, eles que mais do que nunca viram o inimigo sentar-se na Casa Branca, com a eleição de Trump. Eles que estão assistir à construção da nova embaixada dos EUA em Jerusalém, contra todas as resoluções internacionais. E que viram Trump cortar fundos para a UNRWA, a agência das Nações Unidas responsável pelos seis milhões de refugiados palestinianos. A maioria da população em Gaza tem esse estatuto, refugiada, e depende da UNRWA. Se tem algum abrigo, alguma comida, alguma educação, algum cuidado de saúde, é devido à UNRWA. Faca de dois gumes, porque isso também permite que Israel, e o mundo, continuem a assobiar para o ar.
E não tenho forma de a contactar, mas gostava muito de saber o que Rozan, aquela estudante de Gaza, pensa de tudo isto. Ela não tem uma cabeleira loura descoberta como Ahed Tamimi, a brava adolescente da Cisjordânia que se tornou recentemente um símbolo da luta pró-palestiniana, condenada a oito meses de pisão por ter esbofeteado um soldado isrealita. Rozan não é a cara com que uma plateia não-muçulmana se identifica mais facilmente, nem usa as roupas casuais de Ahed. Tal como Gaza não é a Cisjordânia, nem os forasteiros podem entrar em Gaza como entram na Cisjordânia. É mesmo muito difícil uma rapariga de Gaza não cobrir o cabelo, ainda que não seja essa a sua escolha. E é em Gaza que Rozan, como todos os outros, marcha pela vida todos os dias. Espero o dia em que a América, e o mundo, também se possam ver na cara dela.
Créditos / Agência Lusa
E a verdade chegou pelo rosto e pela voz que não encobrem as normas escabrosas regedoras do mundo, aplicadas por estruturas dominantes sem princípios nem valores, mesquinhas, desumanas, xenófobas, hipócritas. No seu discurso boçal, mas franco, Donald Trump disse que o rei ia nu, isto é, proclamou o que toda a gente sabia mas nenhum dos seus parceiros ousava admitir: não há lugar para a solução de dois Estados na Palestina. Ou seja, nega-se ao povo palestiniano o direito ao seu Estado. É uma cruel ignomínia; mas também é, por ora, a realidade dos factos.
Milhões de dedos escandalizados espetaram-se na figura odienta do novo presidente dos Estados Unidos da América, autor de uma blasfémia contra o direito internacional e, sobretudo, inquietador das boas consciências dos chefes da ONU, da União Europeia, de todos os «quartetos para a paz» feitos e desfeitos, de quantos se contentam em garantir a criação de dois Estados na Palestina enquanto o único existente, protegido a qualquer preço pelos poderes dominantes – vai engolindo palmo-a-palmo, traulitada-a-traulitada, todo o pedaço de terra onde deveria nascer o outro.
Avaliando, sem rodeios nem sob o efeito de melífluas declarações diplomáticas, a situação no Médio Oriente, apenas pode concluir-se que a solução de dois Estados na Palestina fracassou há muito. Terá morrido até à nascença, há 70 anos, quando as Nações Unidas, na vetusta e incumprida resolução 181, de 27 de Novembro de 1947, aprovaram o plano de partilha da Palestina, então sob mandato britânico.
Talvez seja este, afinal, o histórico, magno e escandaloso alcance da polémica proclamação de Trump. Apenas recordou e reafirmou as exigências impostas, em seu tempo, pelos Rockfellers, Rostchilds e quejandos, permanentemente lembradas ao complexo militar, industrial e tecnológico dos Estados Unidos pelos todo-poderosos lobbies judaicos.
O óbito da solução de dois Estados não foi declarado só agora. A resolução da ONU estabelecendo a partilha da Palestina foi logo sabotada pelo recém-nascido Estado de Israel, quando iniciou a limpeza étnica das populações árabes, a rapina dos seus bens, a destruição dos seus lares, vilas, aldeias e propriedades; prosseguiu com as deportações e anexações contínuas, as guerras de 1968, 1973, 1982, 1986, 1996...
A possibilidade de existência de um Estado Palestiniano ressurgiu vagamente com os acordos Rabin-Arafat de 1993, logo desmantelada pelo assassínio do então primeiro-ministro israelita e pela sequente sabotagem das negociações de paz por Peres, Sharon, Netanyahu, os beneficiários políticos da liquidação de Isaac Rabin por um criminoso saído das suas fileiras.
«A arrastada coexistência de falsas negociações com a colonização israelita da Cisjordânia, sempre em crescendo, e o sangrento desmantelamento de Gaza, inviabiliza, de facto, a existência de um Estado independente que tenha condições para sobreviver.»
A arrastada coexistência de falsas negociações com a colonização israelita da Cisjordânia, sempre em crescendo, e o sangrento desmantelamento de Gaza, inviabiliza, de facto, a existência de um Estado independente que tenha condições para sobreviver. Resta o gueto dito «autónomo» de Ramallah, preso nas suas próprias malhas, submetido ao ocupante sionista, mergulhado nos vícios da pequena e baixa política, joguete de interesses de uma aliança espúria entre o Estado segregacionista de Israel, agora plenamente racista e fascizante, e as petroditaduras do Golfo, com a Arábia Saudita à cabeça.
A tudo isto o mundo assistiu nos últimos 25 anos, repetindo a ladainha dos dois Estados como um mantra – enquanto Israel prosseguia tranquilamente a colonização/ocupação, acusando os palestinianos de se recusarem a negociar por contestarem as ininterruptas invasões dos destacamentos de assalto colonizadores.
A opinião pública deixou-se embalar nesta espécie de determinismo dos dois Estados, crente de que um dia qualquer veria nascer um Estado Palestiniano, espécie de sucedâneo dos milagres criadores de Bósnias, Kosovos, Sudões do Sul, Somalilândias; até que Trump estilhaçou o limbo com a crueza da verdade repelente: não há – nem nunca houve – ideia de cumprir a promessa da existência de dois Estados na Palestina.
A União Europeia, a ONU, as famílias Bush e Clinton, o próprio Obama sobem então ao palco exibindo consciências virginais, clamando contra o maléfico atrevimento do novo presidente norte-americano. Contudo, eles sabem como ninguém do que fala Trump.
Com eles esfumou-se a possível criação de um Estado palestiniano, porque cobriram, toleraram e encorajaram sempre a estratégia dilatória e as práticas criminosas de Israel. E a Obama, que se ufana de ter permitido a primeira resolução do Conselho de Segurança contra a colonização, há que recordar que o fez com oito anos de atraso. O ex-presidente sabia perfeitamente que qualquer dos seus sucessores – fosse Hillary Clinton ou Trump – inverteria tal posição, assumida já em fase de transição de mandato.
A proclamação sionista de Donald Trump tem ainda um outro significado, que não pode ficar soterrado nos escombros dos inflamados, hipócritas e inócuos protestos da chamada «comunidade internacional». O seu tom e conteúdo provam que o actual presidente norte-americano não surge do exterior do establishment e à margem do complexo militar, industrial e tecnológico que domina o sistema de poder federal e imperial.
Trump é o homem escolhido para o actual momento de crise e contradições da desordem capitalista neoliberal. As proclamações trovejantes por ele proferidas, em sintonia com as vontades da teia financeira, económica e política dos lobbies judaicos, confirmam-no – caso houvesse dúvidas.
Trump é a verdadeira imagem da América e do capitalismo de hoje.
Em Gaza a vida morre a todos as horas Em Gaza as horas não contam a vida Em Gaza todas as horas contam a morte Em Gaza todas as horas são horas da morte Em Gaza a vida está pelas horas da morte Em Gaza não há vida que não enfrente as horas da morte Em Gaza a morte não tem horas Em Gaza a morte não é natural Em Gaza a morte não é natureza Em Gaza a morte é intemporal Em Gaza a morte é artificial Em Gaza a morte é certeza
Em Gaza a morte vem de tanques e aviões Em Gaza a morte está na farda dos soldados Em Gaza a morte está nos corações Em Gaza a morte está no medo Em Gaza a morte está nas prisões Em Gaza a morte está no horizonte Em Gaza a morte está à porta Em Gaza a morte vem de noite Em Gaza a morte vem de dia Em Gaza o sol não nasce Em Gaza o sol nasce sombra e frio Em Gaza o sol é uma criança a chorar Em Gaza o sol é uma criança a morrer
Em Gaza não há luar Em Gaza a lua é de chumbo Em Gaza não há tempo de sentir Em Gaza não há forma de fugir Em Gaza não há tempo de ficar Em Gaza só há tempo de morrer Em Gaza as estrelas não cintilam Em Gaza as estrelas tremem Em Gaza não há vento Em Gaza o vento é das balas Em Gaza não há sonhos Em Gaza não há crianças Em Gaza os sonhos são escolas Em Gaza as escolas e as crianças são alvos da morte Em Gaza a morte ceifa as crianças e os pais e os avós das crianças Em Gaza a morte arrasa Em Gaza a morte arrasa escolas e hospitais Em Gaza a morte vem do inferno Em Gaza a morte é tempestade Em Gaza a morte é sôfrega Em Gaza a morte é maciça Em Gaza a morte é poderosa Em Gaza a morte é moderna Em Gaza a morte é digital Em Gaza a morte é matemática Em Gaza a morte é de rajada Em Gaza a morte é fulminante Em Gaza a morte despedaça Em Gaza a morte é devastadora Em Gaza a morte é uma desgraça Em Gaza a morte são rios de sangue Em Gaza a morte vem do céu Em Gaza a morte não vem por ordem do céu Em Gaza a morte vem do inferno Em Gaza a morte vem do outro lado Em Gaza a morte vem do lado de lá do muro Em Gaza a morte vem do povo eleito.
José Goulão O humanismo, segundo Netanyahu
Não foi um terramoto...
Mundo Cão, 4 de Maio de 2015
“Bravo pela ajuda humanitária enviada por Israel para o Nepal; mas Gaza continua à espera de ser reconstruída, sem dúvida porque não se trata de um tremor de terra”.
Este pequeno anúncio foi publicado no jornal israelita Haaretz pela organização não- governamental Gush Shalom, formada por cidadãos de Israel que se opõem à colonização e ao genocídio que continua a ser cometido na Faixa de Gaza, perante os olhos cúmplices e hipócritas das organizações e dirigentes mundiais com capacidade de decisão.
Ou seja, o governo que envia equipas de resgate para os escombros provocados pelo terramoto no Nepal é o mesmo que recorre aos serviços de um dos mais poderosos exércitos do mundo para manter sitiada e sujeita a sistemáticas operações de liquidação uma população de quase milhão e meio de pessoas. A propaganda dominante que assaltou o papel da comunicação, bem financiada por magnatas que se entronizaram como patrões da liberdade de expressão, tudo faz para que estas associações de factos tão mal intencionadas não passem pelos crivos da neocensura.
Mais ou menos ao mesmo tempo que Netanyahu teve a gentileza de se lembrar dos nepaleses vítimas do trágico sismo, o representante da Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos (UNRWA) em Gaza, Chris Gunness, anunciou que, passados oito meses, não foi reconstruída ainda uma única casa das 9161 arrasadas pelo assalto israelita do último Verão. Como devem estar lembrados, nessa altura numerosos governos incapazes de condenar frontalmente a estratégia de genocídio praticada pelo governo israelita multiplicaram declarações sobre a disponibilidade para ajudarem as vítimas do massacre. As instituições europeias lembraram até que são as maiores contribuintes para a população de Gaza, se bem que, ao mesmo tempo, continuem a manter um acordo económico preferencial com o governo israelita. Tal como acontece, aliás, com o governo de Marrocos – o que preocupa a União Europeia não é bem a existência de ocupações e colonialismo, mas sim parecer bem na fotografia junto dos pobres e carenciados enquanto os negócios fluem como devem fluir nesta saga em que o direito à grande propriedade prevalece sobre todos os outros direitos humanos.
Pois bem, apesar das promessas e proclamações de boa vontade, Gunness anunciou que a UNRWA recebeu, em oito meses, as contribuições suficientes para construir 200 casas, cerca de dois por cento das necessidades. Então porque não construiu ao menos essas? Ora aí está uma boa pergunta, embora a resposta seja previsível. Porque o cerco montado pelas tropas israelitas à Faixa de Gaza, com a prestimosa ajuda da ditadura militar Egipto/Pentágono, veda a entrada da maioria dos materiais de construção, por suspeição de poderem ser utilizados no fabrico e lançamento de rockets. Note-se que 9161 é o número de casas totalmente destruídas, porque foram atingidas mais de 120 mil com danos de maior ou menor gravidade. Lembrando os mais de 2200 civis mortos na ocasião, entre os quais 577 crianças, e os mais de 11 mil feridos (3380 crianças) e sem entrar em comparações, trata-se de uma hecatombe à escala de um terramoto – suficiente para cativar Netanyahu no caso de se deixar guiar por qualquer outra coisa que não sejam a imagem e um tenebroso culto messiânico (e se o Messias for o mercado é ouro sobre azul).
Nos dias que correm acontecem em Israel numerosas manifestações de sectores sociais e étnicos – palestinianos com nacionalidade israelita, judeus etíopes, por exemplo – todas elas contra a sociedade de apartheid institucionalizada no país. Socorrer nepaleses enquanto se pensa na próxima operação para matar palestinianos não é um caso específico de apartheid, mas um exemplo flagrante de como funcionam mentes capazes de gerar apartheids.
http://www.jornalistassemfronteiras.com/index.php
Christopher Wadi, Cairo Gaza em asfixia total
2 de Novembro de 2014
Israel anunciou o encerramento dos postos fronteiriços de Kerem Shalon e Erez, os únicos acessos ainda possíveis à Faixa de Gaza. A partir de agora, o território palestiniano está completamente “fechado ao mundo”, como diz um habitante contactado telefonicamente.
As autoridades israelitas anunciaram a medida poucas horas depois de terem reaberto o acesso à mesquita de Al Aqsa, em Jerusalém, depois de o encerramento ter provocado uma onda mundial de protestos.
O motivo invocado oficialmente pela administração de Telavive para fechar as entradas é o de que da Faixa de Gaza foi disparado um engenho para território israelita. Israel reconhece que o disparo não provocou prejuízos e que a sua autoria não foi reivindicada.
“É a medida punitiva mais grave tomada por Israel até hoje”, diz um professor do território contactado telefonicamente. “Receamos que esteja para acontecer uma nova escalada de violência israelita e agora a nossa asfixia é total, porque nada podemos esperar também do Egipto”.
No Cairo tem subido continuamente de tom a propaganda contra os túneis que ligam o Egipto à Faixa de Gaza, que eram as mais importantes vias de abastecimento de víveres e apoio sanitário ao território onde vivem mais de milhão e meio de pessoas em apenas 320 quilómetros quadrados.
“Os Estados Unidos e Israel não deixam respirar o governo militar de Al Sissi para que este isole ainda mais os palestinianos de Gaza”, diz um activista de um grupo de resistência contra o sistema ditatorial. “O regime de Al Sissi mandou construir uma ‘zona tampão’ entre o território do nosso país e a zona de Rafah, onde o único local de acesso a Gaza a partir do Egipto também está fechado. A partir de agora, Gaza está também bloqueada pelo Egipto e temos conhecimento de que muitas pessoas estão a abandonar Rafah temendo o pior”, informou a mesma fonte.
“Aqui em Gaza não temos dúvida de que o míssil de que Israel fala é um caso mal explicado e não passa de um pretexto para nos bloquear totalmente”, denuncia o professor contactado no território. “Se ninguém reivindicou o seu lançamento qualquer coisa soa a falso, porque os grupos da resistência em Gaza assumem sempre as suas acções. Estamos perante uma vingança sobre as populações palestinianas ainda resultante do golpe sofrido por Israel pelo facto de a Suécia ter reconhecido o Estado da Palestina”, acrescenta a fonte.
Segundo o habitante de Gaza contactado, a “mensagem de Israel ao mundo é simples: se outros países seguirem o exemplo da Suécia serão os palestinianos a sofrer tanto através da colonização, como dos bloqueios, como da guerra”.
“Nós também temos a nossa mensagem”, disse o professor. “Precisamos de mais e mais reconhecimentos de muitos países de todos os continentes; estamos dispostos a resistir para conseguir a nossa libertação. Além disso, estamos conscientes de que os países do mundo têm cada vez mais a noção de que aquilo a que Israel chama ”negociações” ou “processo de paz” não existe, é apenas uma armadilha para fazer passar o tempo até que a criação do nosso Estado seja impossível na prática”.
Segundo os responsáveis israelitas, apenas o que qualificam como “auxílio humanitário crítico” poderá entrar em Gaza. Durante a recente operação de agressão ao território, o exército israelita provocou mais de 2150 mortos, 11 mil feridos e a destruição de 15670 casas.
Daqui a quanto tempo vai Israel destruir o que resta? O mundo está a saque. Ninguém julga crimes de guerra nem genocídios
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Obrigada! Texto maravilhoso a ler e reler! Desde p...
Muito interessante este texto do Raul Brandão. Que...
Desculpe, mas isto é demasiado grande para ser o c...